quarta-feira, 19 de fevereiro de 2014

Ogã Erenilton calou-se no plano terrestre

Ogã Erenilton em pose para especial premiado de A TARDE, “Os homens que chamam os deuses pra terra”. Foto: Margarida Neide/ Ag. A TARDE/

A pedidos de pessoas que não conseguiram ler a matéria sobre a passagem para o orum do ogã Erenilton, publicada no último sábado em A TARDE, estou reproduzindo aqui o texto.

Cleidiana Ramos

Calou-se, no plano terrestre, a voz de um dos membros da grande escola dos sacerdotes músicos do candomblé: Erenilton Bispo dos Santos, 70 anos, foi sepultado no dia 17 de fevereiro de 2014, no Jardim da Saudade. Ele foi também um incansável defensor da sobrevivência dos afoxés por meio do grupo Filhos de Korin Efan, do qual era presidente.

Filho de Omolu, ogã Erenilton era alabê – título usado pelos sacerdotes músicos na tradição ketu – do Terreiro Oxumarê, localizado no bairro da Federação.

Dono de um vasto conhecimento sobre os cantos e ritmos do candomblé, era recebido com um toque especial dos atabaques nos terreiros das variadas nações.

“Ele tocava para o orixá. Era um prazer vê-lo cantar. Foi meu irmão, meu amigo, uma pessoa que dedicou sua vida ao candomblé e ao afoxé”, afirma Tânia Bispo. Ela é mayé do Terreiro Oxumarê, título para o mais alto posto no grupo das ekedes (sacerdotisas que não entram em transe) e irmã biológica do ogã Erenilton.

Ele gozava de um extremo respeito também entre os xicarangomas e huntós, como são chamados, respectivamente, os sacerdotes músicos nas nações angola e jeje.

Herança “Sabemos que ele está no outro plano junto com aqueles que já partiram para reforçar a nossa caminhada”, diz o tata Xuxuca Moxingoma, nome sagrado de Esmeraldo Emetério, xicarangoma do terreiro Tumba Junçara.

Segundo tata Xuxuca, ogã Erenilton será sempre lembrado pela insistência e luta para manter a coerência dos ritmos do candomblé e o comportamento elegante.

“Ele sempre esteve preocupado em marcar a diferença entre o toque religioso e o recreativo usado nos grupos musicais. Não aceitava a mistura”, diz.

Conhecido por, nos últimos anos, reger a orquestra do candomblé apenas com a voz – sentado em um banco e segurando uma toalha para enxugar o suor –, o sacerdote tinha um apreço especial pela correção tanto da melodia como da pronúncia.

“Meu mestre tinha uma marca especial que era a busca da perfeição. Cantar ou tocar errado era motivo para correção imediata. Ele pegava o gã e ensinava”, relata o historiador Jaime Sodré, xicarangoma do terreiro Tanuri Junçara e oloiê do Bogum.

Sodré também destaca o amor incondicional que ogã Erenilton tinha pelos afoxés. “Essa manifestação era a sua tentativa de mostrar como o povo de santo deve se portar no espaço carnavalesco”.

De acordo com Sodré, o ogã Erenilton formou uma grande dupla com o ogã Alcides, conhecido como Cidinho, também do Oxumarê. “Eles são representantes de um estilo típico dos mais antigos que tem um sonoridade cadenciada”, completa.

Alabê do terreiro Casa Branca, Edvaldo de Araújo Santos, conhecido como Papadinha, destaca as lições deixadas pelo ogã Erenilton.

“O orum deve estar cheio de alegria com a sua chegada. É o último dos grandes do passado, mas deixou discípulos. Tive a honra de vê-lo junto a outros dos antigos, como Cipriano e Jorge”, acrescenta.

Sacerdote ilustra especial de A TARDE

Ogã Erenilton Bispo dos Santos foi um dos personagens da capa do especial “Os homens que chamam os deuses pra terra”, publicado em 20 de novembro de 2012 por A TARDE, em comemoração ao Dia Nacional da Consciência Negra. O especial foi premiado na categoria mídia impressa, na edição do ano passado do Prêmio Abdias Nascimento. A premiação é uma das mais importantes do jornalismo brasileiro



Tags: candomblé, Ogã Erenilton, orixás, Terreiro Oxumarê


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Manoel Messias Pereira

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